Todas as empresas no Brasil contribuem para o financiamento dos benefícios decorrentes de acidentes de trabalho através do pagamento do Seguro de Acidente de Trabalho (SAT), atualmente denominado Riscos Ambientais do Trabalho (RAT). Essa contribuição incide sobre a folha de salários e possui alíquotas básicas de 1%, 2% ou 3%, dependendo do grau de risco da atividade econômica principal (CNAE). O que muitas empresas ainda não gerenciam com a devida atenção é que essa alíquota básica não é fixa; ela pode ser reduzida à metade (multiplicada por 0,5) ou duplicada (multiplicada por 2,0) anualmente, através de um mecanismo chamado FAP – Fator Acidentário de Prevenção. O FAP funciona como um verdadeiro termômetro, medindo o desempenho da empresa em saúde e segurança do trabalho (SST) em comparação com outras do mesmo setor, e seu resultado tem um impacto financeiro direto e relevante nos custos empresariais.
O FAP é, essencialmente, um índice multiplicador, calculado anualmente pela Previdência Social para cada estabelecimento empresarial (identificado pelo CNPJ completo), que ajusta a alíquota RAT básica. Seu valor varia dentro de uma faixa que vai de 0,5000 (indicando um desempenho em SST significativamente melhor que a média do setor) a 2,0000 (indicando um desempenho pior que a média). Um FAP de 1,0000 significa que o desempenho da empresa está na média do seu setor econômico. Se uma empresa consegue um FAP abaixo de 1,0000, ela recebe um “bônus”, pagando menos RAT do que a alíquota básica. Se o FAP fica acima de 1,0000, ela sofre um “malus”, pagando mais. O cálculo é retrospectivo, baseando-se no histórico de acidentalidade dos dois anos civis completos anteriores ao ano de vigência do FAP. Por exemplo, o FAP que vigora durante todo o ano de 2025 foi calculado em 2024 com base nos dados de acidentes e benefícios registrados em 2022 e 2023.
O cálculo exato do FAP é complexo e envolve uma metodologia estatística definida pela Previdência Social, que considera e pondera diversos indicadores de acidentalidade, comparando o desempenho do estabelecimento com a mediana dos demais estabelecimentos da mesma subclasse CNAE. Os principais elementos que entram nesse cálculo são:
- Frequência: O número de ocorrências de acidentes e doenças do trabalho registrados para os trabalhadores daquele estabelecimento. Isso inclui as CATs que resultaram em benefícios e também os benefícios acidentários concedidos via NTEP.
- Gravidade: A duração dos afastamentos decorrentes desses eventos, medida pelo tempo de pagamento dos benefícios por incapacidade temporária (B91), aposentadoria por invalidez (B92), pensão por morte (B93) e auxílio-acidente (B94). Eventos mais graves (morte, invalidez) têm um peso maior.
- Custo: O montante total dos valores pagos pela Previdência Social a título de benefícios acidentários para os trabalhadores daquele estabelecimento no período considerado. A combinação desses três fatores (frequência, gravidade e custo), devidamente ponderada e comparada com o desempenho do setor, resulta no índice FAP final do estabelecimento.
O impacto financeiro do FAP pode ser extremamente significativo, especialmente para empresas com grandes folhas de pagamento. Vamos ilustrar com um exemplo simplificado: uma empresa do setor de serviços (RAT 2%) com folha anual de R$ 10 milhões.
- Cenário 1 (Excelente Prevenção): FAP = 0,5000. Alíquota efetiva = 2% * 0,5000 = 1,00%. Custo anual do RAT = R$ 100.000.
- Cenário 2 (Prevenção na Média): FAP = 1,0000. Alíquota efetiva = 2% * 1,0000 = 2,00%. Custo anual do RAT = R$ 200.000.
- Cenário 3 (Prevenção Deficiente): FAP = 2,0000. Alíquota efetiva = 2% * 2,0000 = 4,00%. Custo anual do RAT = R$ 400.000. Neste exemplo, a diferença anual entre ter uma gestão de SST de excelência e uma gestão deficiente é de R$ 300.000, liberados ou consumidos diretamente pela variação do FAP. Esse valor poderia ser reinvestido na própria prevenção, em benefícios aos trabalhadores ou no crescimento do negócio.
Anualmente, a Previdência Social divulga os resultados do FAP (geralmente em setembro), que valerão para todo o ano seguinte. As empresas têm acesso aos dados específicos que foram considerados no cálculo do seu FAP (número de benefícios, massas salariais, vínculos, etc.). A partir dessa divulgação, abre-se um prazo curto (usualmente 30 dias) para que as empresas apresentem contestação administrativa caso identifiquem erros nos dados de base utilizados pela Previdência (ex: um benefício computado indevidamente, erro na massa salarial, vínculo inexistente) ou discordem da aplicação da metodologia. Uma contestação bem-sucedida, que reduza o índice FAP, pode representar uma economia expressiva e imediata. Esse processo exige análise técnica detalhada dos dados e, frequentemente, o auxílio de consultoria especializada.
Contudo, mais importante do que apenas contestar o FAP, é utilizá-lo como uma ferramenta estratégica de gestão e um indicador chave de desempenho (KPI) da área de SST. Um FAP persistentemente alto ou crescente é um sintoma claro de que as ações de prevenção não estão sendo eficazes e que a saúde e a segurança dos trabalhadores estão em risco, além do prejuízo financeiro. A forma mais sustentável e ética de reduzir o FAP é investir continuamente em um programa robusto de SST: PGR bem elaborado e implementado, PCMSO atuante na prevenção e monitoramento, gestão ergonômica eficaz, treinamentos de segurança que engajem, promoção de uma cultura de segurança em todos os níveis e análise profunda das causas de acidentes e adoecimentos para evitar reincidências. Empresa: não veja o FAP apenas como uma taxa a ser paga. Analise seus componentes, entenda suas causas e use-o para direcionar seus investimentos em prevenção. O retorno virá não apenas na redução da alíquota, mas principalmente na preservação de vidas, na melhoria do clima organizacional e na sustentabilidade do seu negócio. O FAP é a prova numérica de que investir em segurança e saúde compensa – para todos.