Diretivas Antecipadas de Vontade (Testamento Vital): Planeje Seu Futuro e Garanta Sua Autonomia nas Decisões de Saúde

Imagine um cenário futuro onde você, por motivo de doença grave ou acidente, fica impossibilitado de expressar suas vontades sobre os tratamentos médicos que deseja ou não receber. Quem decidirá por você? Seus familiares? Os médicos? E se as decisões deles não refletirem seus valores e desejos mais profundos? É para evitar essa angústia e garantir o respeito à sua autonomia que existem as Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV), popularmente conhecidas como Testamento Vital. Este é um instrumento legal e ético que permite a qualquer pessoa maior e capaz registrar, prévia e expressamente, suas vontades sobre cuidados e tratamentos de saúde para o momento em que não puder mais se comunicar. Planejar o futuro é um ato de autonomia, cuidado e respeito por si mesmo. Você já pensou sobre como gostaria de ser cuidado em momentos críticos?
Embora ainda não exista uma lei federal específica no Brasil que regulamente as DAVs, sua validade e importância são reconhecidas com base em princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, CF/88) e a autonomia da vontade. O Conselho Federal de Medicina (CFM), através da Resolução nº 1.995/2012, foi pioneiro ao regulamentar as DAVs do ponto de vista ético-profissional. Esta resolução define as diretivas como o “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade”. Ela determina que a vontade do paciente, expressa nas DAVs, prevalecerá sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares, cabendo ao médico registrar as diretivas no prontuário, desde que não violem a ética médica ou a legislação.
Mas o que exatamente pode constar em um Testamento Vital? O documento permite que você especifique diversos cenários e vontades, como: recusar tratamentos considerados fúteis ou inúteis (distanásia), que apenas prolongam artificialmente o processo de morte sem perspectiva de cura ou melhora; aceitar ou recusar determinados procedimentos (ventilação mecânica, quimioterapia, alimentação e hidratação artificial, transfusão de sangue); indicar se deseja ou não ser submetido à reanimação cardiorrespiratória em caso de parada; expressar o desejo por cuidados paliativos focados no alívio da dor e do sofrimento; e até mesmo indicar onde gostaria de passar seus últimos dias (hospital, casa, instituição de cuidados). Por exemplo, a Sra. Joana, 68 anos, após ver um familiar passar por um longo e sofrido processo de internação com tratamentos invasivos, decidiu elaborar suas DAVs especificando que, em caso de doença terminal irreversível, não deseja ser mantida viva por aparelhos, priorizando cuidados paliativos para conforto. Essa clareza prévia evita conflitos familiares e dilemas éticos para a equipe médica.
Além de registrar suas vontades sobre tratamentos, as DAVs permitem que você nomeie um procurador de saúde (também chamado de representante). Esta é uma pessoa de sua confiança (familiar, amigo) que ficará responsável por comunicar suas vontades aos médicos e garantir que elas sejam respeitadas, caso você não possa mais fazê-lo. É fundamental que essa pessoa conheça profundamente seus valores e desejos e concorde em assumir essa responsabilidade. A nomeação do procurador fortalece ainda mais a efetividade das suas diretivas, pois haverá alguém especificamente designado para advogar por suas vontades no momento da decisão médica. Escolher um procurador de saúde é um passo importante para garantir que sua voz seja ouvida, mesmo no silêncio.
Como fazer um Testamento Vital? A Resolução do CFM não exige formalidades específicas, como registro em cartório. Ele pode ser feito por escrito, em documento particular, datado e assinado por você, preferencialmente com a assinatura de duas testemunhas. No entanto, para maior segurança jurídica e para facilitar sua localização quando necessário, recomenda-se fortemente que você converse com seu médico de confiança e peça para registrar suas DAVs no seu prontuário médico. Outra opção é fazer o documento por escritura pública em um Tabelionato de Notas, o que confere maior formalidade e publicidade. Independentemente da forma, é essencial que você dialogue abertamente com seus familiares e com o procurador de saúde escolhido sobre suas decisões, explicando seus motivos e garantindo que eles compreendam e respeitem suas vontades. A comunicação clara é a chave para evitar mal-entendidos e conflitos futuros.
As Diretivas Antecipadas de Vontade são uma ferramenta poderosa de exercício da autonomia e planejamento pessoal, especialmente relevante no contexto do envelhecimento e da maior prevalência de doenças crônicas. Elaborar seu testamento vital não é “antecipar a morte”, mas sim garantir que sua vida, até o último momento, seja vivida e cuidada de acordo com seus próprios valores e desejos. É um ato de responsabilidade que traz tranquilidade para você e para seus entes queridos. Se você tem dúvidas sobre como elaborar suas DAVs, quais aspectos considerar ou como garantir sua validade e respeito, buscar orientação jurídica pode ser muito útil. Um advogado pode auxiliar na redação do documento, esclarecer pontos legais e éticos, e orientar sobre a melhor forma de comunicar suas vontades à família e aos médicos. Não deixe que o futuro decida por você; planeje hoje como você deseja ser cuidado amanhã.