A Relação entre a Lei de Improbidade Administrativa e os Crimes Contra a Administração Pública

Introdução: A Ética na Gestão Pública: A Intima Relação entre a Lei de Improbidade Administrativa e os Crimes Contra a Administração Pública

A Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA) e os crimes contra a administração pública, previstos no Código Penal, são dois importantes instrumentos jurídicos para a proteção da probidade administrativa e a responsabilização de agentes públicos que praticam condutas ilícitas no exercício de suas funções. Embora possuam naturezas jurídicas distintas – a LIA trata de ilícitos de natureza civil e administrativa, enquanto os crimes contra a administração pública são de natureza penal –, existe uma íntima relação entre eles, pois muitas condutas que configuram atos de improbidade administrativa também podem constituir crimes contra a administração pública, e vice-versa. Compreender essa relação entre a Lei de Improbidade Administrativa e os crimes contra a administração pública é fundamental para uma atuação mais eficaz no combate à corrupção e na defesa do patrimônio público.

A Lei de Improbidade Administrativa: Sanções Civis e Administrativas

A Lei de Improbidade Administrativa visa punir agentes públicos que atentem contra os princípios da administração pública, como a honestidade, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a eficiência. A LIA prevê três categorias de atos de improbidade:

  • Atos que importam enriquecimento ilícito (Art. 9º): Obter qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do cargo, como receber propina ou utilizar bens públicos em proveito próprio.
  • Atos que causam prejuízo ao erário (Art. 10): Causar perda patrimonial aos cofres públicos, como desviar recursos, celebrar contratos superfaturados ou realizar pagamentos indevidos.
  • Atos que atentam contra os princípios da administração pública (Art. 11): Praticar condutas desonestas, ilegais ou imorais que violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, como fraudar licitações ou utilizar o cargo para obter vantagens pessoais.

As sanções previstas na LIA para os atos de improbidade incluem a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos, o pagamento de multa civil, o ressarcimento integral do dano causado ao erário e a proibição de contratar com o poder público.

Crimes Contra a Administração Pública: Sanções Penais

Os crimes contra a administração pública, previstos no Título XI do Código Penal, visam proteger o bom funcionamento da administração pública e a probidade dos seus agentes. Alguns dos principais crimes contra a administração pública incluem:

  • Peculato (Art. 312): Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo em proveito próprio ou alheio.
  • Corrupção Passiva (Art. 317): Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.
  • Corrupção Ativa (Art. 333): Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício.
  • Prevaricação (Art. 319): Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
  • Concussão (Art. 316): Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida.

As sanções previstas no Código Penal para esses crimes incluem penas privativas de liberdade (reclusão ou detenção) e multa.

A Interseção entre Atos de Improbidade e Crimes Contra a Administração Pública

Muitas condutas praticadas por agentes públicos podem configurar tanto atos de improbidade administrativa quanto crimes contra a administração pública. Por exemplo: 

  • Receber propina: Configura ato de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito (Art. 9º da LIA) e crime de corrupção passiva (Art. 317 do CP). 
  • Desviar recursos públicos: Configura ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário (Art. 10 da LIA) e crime de peculato (Art. 312 do CP). 
  • Fraudar uma licitação: Pode configurar ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública (Art. 11 da LIA) e crime de fraude em licitação (Lei nº 8.666/93 ou Lei nº 14.133/21).

Exemplo Prático: Um Agente Público que Desvia Recursos para sua Conta Pessoal  

Imagine um agente público que se apropria de recursos públicos que estavam sob sua guarda em razão do cargo e os transfere para sua conta bancária pessoal. Essa conduta configura claramente o crime de peculato (Art. 312 do CP), punível com pena de reclusão e multa. Ao mesmo tempo, essa conduta também caracteriza um ato de improbidade administrativa que importa enriquecimento ilícito (Art. 9º da LIA) e causa prejuízo ao erário (Art. 10 da LIA), sujeitando o agente público às sanções civis e administrativas previstas na lei.

A Independência das Esferas de Responsabilidade

É importante ressaltar que as esferas de responsabilidade civil/administrativa (LIA) e penal (Código Penal) são independentes. Um mesmo fato pode gerar a responsabilização do agente público em ambas as esferas, com a aplicação das sanções correspondentes em cada uma delas. A absolvição na esfera penal por falta de provas, por exemplo, não impede a condenação na esfera da improbidade administrativa, caso existam provas suficientes para a configuração do ato ímprobo.

O Papel do Ministério Público e dos Órgãos de Controle

O Ministério Público possui legitimidade para propor tanto ações de improbidade administrativa quanto ações penais por crimes contra a administração pública. Os órgãos de controle, como os Tribunais de Contas e a Controladoria-Geral da União, também desempenham um papel importante na identificação de irregularidades e no encaminhamento de informações para as autoridades competentes.

O Papel do Advogado Especializado em Direito Administrativo Sancionador e Direito Penal Econômico

O advogado especializado em Direito Administrativo Sancionador e Direito Penal Econômico possui o conhecimento necessário para atuar na defesa de agentes públicos em ações de improbidade administrativa e em processos criminais por crimes contra a administração pública. Ele pode analisar a legislação aplicável, identificar as teses defensivas adequadas e buscar a aplicação da lei de forma justa e proporcional em cada uma das esferas de responsabilidade. A expertise jurídica em ambas as áreas é essencial para a proteção dos direitos dos agentes públicos em face de acusações de improbidade e crimes contra a administração.

Conclusão: A Proteção da Probidade Administrativa em Múltiplas Esferas

A relação entre a Lei de Improbidade Administrativa e os crimes contra a administração pública demonstra a preocupação do ordenamento jurídico brasileiro em proteger a probidade administrativa e punir as condutas ilícitas praticadas por agentes públicos. A atuação coordenada dos órgãos de controle e a aplicação das sanções previstas em ambas as leis são fundamentais para garantir a integridade na gestão dos recursos públicos e a confiança da sociedade nas instituições. A ética e a legalidade devem ser os pilares da atuação de todo agente público. A lei está atenta para garantir que assim seja.

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