Saúde Mental na Terceira Idade: Direito ao Tratamento e Como Superar Barreiras no SUS e nos Planos

A saúde mental, por muito tempo negligenciada e cercada de estigmas, é hoje reconhecida como um pilar fundamental para o bem-estar em todas as fases da vida. Na terceira idade, questões como depressão, ansiedade, isolamento social, luto e o próprio declínio cognitivo podem se manifestar com mais intensidade, impactando profundamente a qualidade de vida. No entanto, o acesso a tratamento psicológico e psiquiátrico para idosos ainda enfrenta barreiras significativas, seja pela falta de serviços especializados no SUS, pela cobertura restrita em planos de saúde ou pelo preconceito que impede muitos de buscar ajuda. É vital compreender que a atenção à saúde mental é um direito garantido por lei, parte integral do cuidado em saúde, e que existem caminhos para superar esses obstáculos. Cuidar da mente é tão essencial quanto cuidar do corpo, e negar tratamento adequado é negar dignidade.

A legislação brasileira ampara o direito à saúde mental. A Lei nº 10.216/2001, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, redirecionou o modelo de atenção em saúde mental no Brasil, priorizando o tratamento em serviços comunitários, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), em detrimento das longas internações hospitalares. Essa lei assegura à pessoa portadora de transtorno mental o direito a “ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade” (Art. 2º, Parágrafo único, II). O Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), ao garantir a atenção integral à saúde (Art. 15), implicitamente inclui os cuidados com a saúde mental. Portanto, o SUS tem o dever de oferecer acolhimento, diagnóstico e tratamento para transtornos mentais em idosos, incluindo consultas com psicólogos e psiquiatras, grupos terapêuticos e, quando necessário, medicamentos.

No âmbito dos planos de saúde privados, a cobertura para saúde mental também é obrigatória. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), através de suas Resoluções Normativas (RN), estabelece um Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde que inclui consultas e sessões com psicólogos, terapeutas ocupacionais e psiquiatras. Uma mudança significativa e recente (a partir da RN 541/2022) foi o fim da limitação do número de sessões de psicoterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia cobertas pelos planos para pacientes com qualquer diagnóstico médico que justifique a necessidade desses tratamentos. Imagine a Sra. Lurdes, 69 anos, diagnosticada com ansiedade generalizada pelo seu médico. Seu plano de saúde não pode mais limitar a cobertura a um número fixo de sessões de psicoterapia por ano, devendo cobrir quantas forem necessárias conforme a indicação médica. Essa foi uma vitória importante para os pacientes, mas é preciso estar atento, pois algumas operadoras ainda podem criar barreiras ou exigir autorizações complexas.

Apesar dos direitos garantidos, a realidade impõe desafios. No SUS, a demanda por serviços de saúde mental é frequentemente maior que a oferta, resultando em longas filas de espera para consultas nos CAPS ou nas unidades básicas de saúde. A falta de profissionais especializados em psicogeriatria também é um problema. Nos planos de saúde, mesmo com o fim do limite de sessões, podem surgir dificuldades com a rede credenciada (poucos profissionais disponíveis), negativas de cobertura para certas abordagens terapêuticas ou exigência de co-participação que onera o beneficiário. Além disso, o estigma social ainda faz com que muitos idosos e suas famílias hesitem em procurar ajuda psiquiátrica ou psicológica, associando erroneamente transtornos mentais à “fraqueza” ou “velhice”. Superar o preconceito é o primeiro passo para buscar o cuidado necessário.

Diante de dificuldades no acesso ao tratamento de saúde mental, seja no SUS ou no plano de saúde, é fundamental agir. Se o problema for no SUS, procure a gestão da unidade de saúde, a Secretaria de Saúde local ou a Ouvidoria do SUS. Documente a necessidade do tratamento com laudos médicos. Se a dificuldade ocorrer com o plano de saúde (negativa de cobertura, falta de rede, limite indevido de sessões), registre uma reclamação formal na operadora e na ANS. Guarde todos os protocolos e documentos. No entanto, quando a espera no SUS se torna insustentável ou a negativa do plano persiste, colocando em risco a saúde e o bem-estar do idoso, a via judicial pode ser a solução mais eficaz. A assessoria de um advogado especializado pode ser decisiva para obter uma liminar que determine o início imediato do tratamento, seja pelo SUS (obrigando o município ou estado a fornecer) ou pelo plano de saúde.

A saúde mental é indissociável da saúde geral e um componente essencial para um envelhecimento ativo e digno. Depressão, ansiedade e outros transtornos não são “coisas da idade”, mas condições de saúde que exigem e merecem tratamento adequado. Conhecer seus direitos no SUS e no plano de saúde é fundamental para exigir o cuidado necessário. Não subestime a importância do bem-estar psicológico e não hesite em buscar ajuda profissional, tanto médica quanto jurídica, se encontrar barreiras. A lei protege seu direito à atenção integral, incluindo a saúde mental. Se você ou um ente querido está enfrentando dificuldades para acessar tratamento psicológico ou psiquiátrico, saiba que existem caminhos legais para garantir esse cuidado essencial. Um profissional do direito pode analisar sua situação e orientá-lo sobre as melhores ações a serem tomadas para assegurar seu direito a viver com mais qualidade e saúde mental.

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