Revisão da Guarda Compartilhada: Quando é Possível Alterar o Acordo?

Um acordo de guarda, seja ele homologado por um juiz ou firmado em mediação, representa uma fotografia de um momento específico da vida de uma família. Ele é construído com base nas idades das crianças, na rotina de trabalho dos pais, nos locais de moradia e nas necessidades daquele período. Contudo, a vida é dinâmica. Crianças crescem, pais mudam de emprego ou de cidade, e novas circunstâncias surgem. Diante disso, uma pergunta se torna inevitável para muitas famílias: o acordo de guarda é permanente? A resposta é um sonoro não. O acordo não é uma sentença imutável, e a possibilidade de sua revisão é um mecanismo legal essencial para garantir que ele continue atendendo ao seu propósito primordial: o melhor interesse da criança.
A base legal e principiológica para a revisão de qualquer decisão sobre guarda e convivência reside na cláusula rebus sic stantibus, uma expressão latina que significa “enquanto as coisas permanecerem assim”. Em outras palavras, o acordo é válido enquanto as condições que o originaram se mantiverem. Se houver uma alteração substancial e permanente na situação de fato de um dos genitores ou da própria criança, a revisão do acordo não é apenas possível, mas necessária. Essa mudança, no entanto, precisa ser significativa. Pequenos ajustes na rotina ou desentendimentos pontuais não são suficientes para justificar uma alteração judicial. É preciso demonstrar que o arranjo atual se tornou inviável ou, pior, prejudicial ao bem-estar do filho.
Existem diversos motivos concretos e recorrentes que podem fundamentar um pedido de revisão da guarda compartilhada. Os mais comuns incluem:
- Mudança de Cidade ou País: A mudança de um dos genitores para uma localidade distante que inviabilize o regime de convivência previamente estabelecido (como a alternância semanal) é, talvez, o motivo mais clássico. Nesse caso, o acordo precisará ser completamente reestruturado para um modelo de convivência em feriados e férias, por exemplo.
- Alteração Drástica na Rotina de Trabalho: Se um genitor que tinha ampla flexibilidade passa a ter um emprego com viagens constantes ou horários noturnos, o arranjo original pode se tornar impraticável, exigindo uma redistribuição das responsabilidades.
- A Vontade da Criança ou Adolescente: Conforme a criança amadurece, sua opinião e desejo sobre com quem prefere passar mais tempo ganham peso. A partir dos 12 anos, a oitiva do adolescente em juízo é praticamente obrigatória, e embora sua vontade não seja a única a decidir, ela se torna um fator de grande relevância para o juiz.
- Situações de Risco: A mais grave das razões. Se um dos genitores passa a apresentar comportamento que coloca a criança em risco – como abuso de substâncias, negligência, violência ou alienação parental – a revisão pode ser urgente, podendo levar não apenas a uma alteração no regime de convivência, mas até mesmo à conversão da guarda compartilhada em unilateral.
O processo de revisão pode ocorrer de duas formas: consensual ou litigiosa. A via consensual é sempre a mais recomendada. Nela, os pais, percebendo a mudança na realidade, dialogam e criam um novo Plano de Parentalidade que se adeque à nova situação. Esse novo acordo é então levado ao juiz apenas para homologação, um procedimento rápido e simples. A capacidade de revisar o acordo de forma amigável é o maior indicativo de maturidade e funcionalidade da relação coparental.
Quando o consenso é impossível, a parte que se sente prejudicada ou que identifica a necessidade de mudança deve ingressar com uma “Ação de Revisão de Guarda e Convivência”. Neste processo, será necessário produzir provas robustas que demonstrem a alteração substancial dos fatos. Documentos, testemunhas e, frequentemente, um novo estudo psicossocial serão utilizados para que o juiz possa tomar uma nova decisão. É um caminho mais desgastante, custoso e que pode intensificar o conflito familiar.
Portanto, é crucial entender o acordo de guarda como um documento vivo, que deve respirar e se adaptar junto com a família. A possibilidade de revisão não deve ser vista como uma ameaça, mas como uma garantia de que as necessidades da criança estarão sempre em primeiro lugar. Manter um canal de diálogo aberto e estar disposto a renegociar os termos quando a vida impõe suas mudanças é a forma mais inteligente de honrar o compromisso da guarda compartilhada: o de, juntos, mesmo que separados, prover o melhor para os filhos.