A culpa recíproca na rescisão do contrato de trabalho ocorre quando tanto o empregador quanto o empregado cometem faltas graves que tornam insustentável a continuidade da relação de trabalho. Essa situação é menos comum, mas está prevista na legislação trabalhista e possui regras específicas para o pagamento das verbas rescisórias.
Neste artigo, vamos explicar o que caracteriza a culpa recíproca, quais são os direitos do trabalhador nesse tipo de rescisão e como as empresas devem proceder para evitar conflitos e questionamentos na Justiça.
O Que é a Culpa Recíproca?
A culpa recíproca ocorre quando ambas as partes (empregador e empregado) praticam faltas graves previstas no artigo 482 (faltas do empregado) e no artigo 483 (faltas do empregador) da CLT. Diante dessa situação, a Justiça do Trabalho pode decidir pela rescisão do contrato com direitos reduzidos para o empregado.
Base Legal:
Artigos 482 e 483 da CLT, que tratam das faltas graves que justificam rescisão por justa causa e rescisão indireta, respectivamente.
Exemplos de Culpa Recíproca
Veja situações práticas que podem configurar a culpa recíproca:
- Empregado comete ato de indisciplina e o empregador pratica rigor excessivo, agredindo verbalmente o trabalhador.
- Faltas injustificadas do empregado, combinadas com atrasos reiterados no pagamento de salários por parte do empregador.
- Agressão física mútua entre empregador e empregado no ambiente de trabalho.
- Desídia do empregado (desleixo no desempenho) enquanto o empregador exige serviços superiores às forças do trabalhador.
Nesses casos, cabe à Justiça do Trabalho analisar as provas apresentadas e determinar a rescisão do contrato por culpa recíproca.
Quais São os Direitos do Trabalhador na Culpa Recíproca?
Quando a Justiça reconhece a culpa recíproca, o empregado tem direito ao pagamento parcial das verbas rescisórias. O cálculo das verbas ocorre da seguinte forma:
- Saldo de salário:
Pagamento pelos dias trabalhados até a rescisão. - Metade do aviso prévio:
O valor do aviso prévio, que seria integral em uma dispensa sem justa causa, é reduzido em 50%. - Metade das férias proporcionais + 1/3 constitucional:
O empregado recebe 50% das férias proporcionais acrescidas de 1/3. As férias vencidas, se houver, devem ser pagas integralmente. - Metade do 13º salário proporcional:
O valor do 13º salário proporcional também é reduzido pela metade. - Metade da multa do FGTS (20%):
A multa rescisória sobre o FGTS, que normalmente é de 40%, é reduzida para 20%. - Saque do FGTS:
O empregado pode sacar o saldo do FGTS depositado durante o contrato de trabalho.
Importante: O empregado não tem direito ao seguro-desemprego na rescisão por culpa recíproca, pois o benefício é destinado apenas à dispensa sem justa causa.
Como a Culpa Recíproca é Reconhecida?
A culpa recíproca deve ser reconhecida judicialmente. Isso significa que, mesmo havendo alegações de faltas graves cometidas por ambas as partes, a rescisão por culpa recíproca só será aplicada após decisão da Justiça do Trabalho.
Passos para Reconhecimento:
- Ação Judicial: O empregado ou empregador ingressa com ação trabalhista solicitando o reconhecimento da culpa recíproca.
- Produção de Provas: Ambas as partes devem apresentar provas das faltas cometidas, como:
- Testemunhos;
- Documentos;
- Registros eletrônicos;
- Vídeos ou fotos, se aplicáveis.
- Decisão Judicial: O juiz analisa as provas e decide se houve culpa recíproca, aplicando a redução proporcional das verbas rescisórias.
Exemplo Prático
João, um motorista, começou a faltar injustificadamente ao trabalho. O empregador, irritado com a situação, decidiu descontar indevidamente valores do salário de João e, em um momento de discussão, agrediu verbalmente o empregado.
Diante do conflito, João entrou com uma reclamação trabalhista solicitando a rescisão indireta. O empregador, por sua vez, alegou as faltas graves cometidas por João. A Justiça reconheceu a culpa recíproca e determinou o pagamento das seguintes verbas:
- Saldo de salário integral;
- Metade do aviso prévio;
- Metade das férias proporcionais + 1/3;
- Metade do 13º salário proporcional;
- 20% de multa do FGTS;
- Liberação do saldo do FGTS.
Como o Empregador Deve Proceder?
Para evitar litígios e o reconhecimento da culpa recíproca, a empresa deve:
- Adotar boas práticas de gestão de conflitos:
Investir em comunicação clara e mediação de conflitos no ambiente de trabalho. - Documentar faltas graves:
Caso o empregado cometa faltas, a empresa deve aplicar sanções de forma gradativa e documentada (advertência, suspensão e, em último caso, justa causa). - Evitar reações extremas:
O empregador deve agir de forma ética e dentro dos limites legais, mesmo diante de faltas cometidas pelo empregado.
Decisões Recentes da Justiça do Trabalho
A Justiça do Trabalho tem reafirmado que a culpa recíproca deve ser reconhecida apenas em situações excepcionais, quando ambas as partes comprovam faltas graves.
Decisão do TST:
“Para a configuração da culpa recíproca, é imprescindível que se demonstre, de maneira inequívoca, a prática de faltas graves por ambas as partes, nos termos dos artigos 482 e 483 da CLT.”
O Respeito Evita Conflitos
A rescisão por culpa recíproca é um reflexo de falhas na relação de trabalho. Para evitar essa situação, o respeito mútuo e a mediação de conflitos são fundamentais. Empresas e empregados devem agir com transparência e responsabilidade para garantir uma relação de trabalho saudável.
Conclusão
A rescisão por culpa recíproca ocorre quando empregador e empregado cometem faltas graves, inviabilizando a continuidade do contrato de trabalho. Nesse caso, a Justiça do Trabalho determina o pagamento parcial das verbas rescisórias, assegurando um desfecho equilibrado para ambas as partes.