Reconhecimento de união estável post mortem: a luta pelos direitos sucessórios do companheiro sobrevivente

Imagine a dor de perder a pessoa amada e, além do luto, ter que enfrentar uma batalha judicial para provar que você e seu companheiro viviam uma união estável. Essa é a triste realidade de muitas pessoas que perdem seus parceiros sem terem formalizado a relação. O reconhecimento de união estável post mortem (após a morte) é um tema de extrema relevância no Direito de Família, pois é a única forma de garantir os direitos sucessórios e patrimoniais do companheiro sobrevivente. Afinal, o amor e a convivência não se apagam com a morte, e os direitos gerados por essa relação devem ser reconhecidos e protegidos pela Justiça.
Até 2017, a lei tratava a sucessão na união estável de forma diferente da sucessão no casamento. O companheiro sobrevivente era tratado como herdeiro de segunda classe, e seus direitos eram inferiores aos do cônjuge. Felizmente, essa injustiça foi corrigida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Recurso Extraordinário 878.694. A tese firmada pelo STF foi clara: “É inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do Código Civil”. Com essa decisão, a sucessão na união estável passou a seguir as mesmas regras do casamento, garantindo ao companheiro sobrevivente os mesmos direitos de herança do cônjuge.
O grande desafio, no entanto, é a prova da união estável. Diferentemente do casamento, que tem uma certidão como prova, a união estável precisa ser comprovada por meio de fatos. A lei exige a prova de uma “convivência duradoura, pública e contínua, estabelecida com o objetivo de constituir família”. Na ausência de um contrato de convivência ou de uma escritura pública, a prova da união estável deve ser feita por meio de documentos, como contas conjuntas, contratos de aluguel em nome de ambos, declarações de Imposto de Renda, e por meio de testemunhas que confirmem a vida em comum. É um processo que pode se estender por anos, causando mais dor e sofrimento para quem já está fragilizado pela perda.
A urgência de buscar o reconhecimento de união estável post mortem é evidente, principalmente quando há outros herdeiros, como filhos do falecido, que podem se opor à partilha dos bens. O processo judicial para o reconhecimento da união estável é o primeiro passo para o companheiro sobrevivente ter acesso à herança, à pensão por morte e a outros direitos, como a meação (a metade dos bens comuns do casal). A falta de reconhecimento pode levar o companheiro sobrevivente a perder o direito de moradia no imóvel em que vivia, ou a ser excluído da partilha de bens que ajudou a construir ao longo da vida.
A melhor forma de evitar essa situação é a prevenção. Se você vive em união estável, não espere a morte do seu companheiro para buscar a segurança jurídica. Formalize a sua união por meio de um contrato de convivência, ou por meio de uma escritura pública. O documento é a prova incontestável de que a união existia e, em caso de falecimento, facilita o inventário e a partilha dos bens, evitando conflitos familiares e gastos desnecessários com advogados. A união estável é uma forma de constituir família e deve ser tratada com a seriedade que merece, garantindo que os direitos de quem amamos sejam protegidos, mesmo após a partida.