Prisão Civil do Avô Devedor de Alimentos (Pensão Avoenga): Como Funciona?

A responsabilidade de sustentar um filho é, primariamente, dos pais. Mas o que acontece quando eles, por algum motivo, falham em seu dever? Quando o pai ou a mãe não pode pagar a pensão, ou simplesmente não paga, a lei, em uma expressão do princípio da solidariedade familiar, permite que essa obrigação seja estendida aos avós. É a chamada “pensão avoenga”. Essa responsabilidade, no entanto, levanta uma questão delicada e extrema: seria possível chegar ao ponto de pedir a prisão de um avô ou de uma avó pelo não pagamento da pensão do neto? A resposta, confirmada pela mais alta corte de justiça infraconstitucional do país, é sim. Este artigo explica como funciona essa medida drástica e quais os cuidados que a cercam.

A Natureza da Obrigação Avoenga: Subsidiária e Complementar

Antes de tudo, é preciso entender que a obrigação dos avós não é direta nem automática. Ela possui um caráter excepcional. A responsabilidade avoenga é subsidiária, o que significa que ela só surge na ausência ou impossibilidade total dos pais de proverem o sustento (seja por morte, desaparecimento, doença incapacitante ou desemprego absoluto e comprovado). Ela também pode ser complementar, ou seja, ela serve para suplementar o valor pago pelo genitor, caso este seja insuficiente para cobrir as necessidades básicas da criança. Para que um avô ou avó seja judicialmente obrigado a pagar a pensão, é requisito indispensável que o credor (o neto, representado por seu guardião) prove no processo a impossibilidade do genitor principal de arcar com a obrigação.

A Possibilidade da Prisão: O STJ Confirma a Aplicação da Medida Coercitiva

Uma vez que a obrigação alimentar dos avós é fixada por uma decisão judicial, ela adquire a mesma natureza jurídica da pensão devida pelos pais: é uma verba alimentar, essencial para a subsistência e de caráter urgente. Diante disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento de que, sendo a dívida de natureza alimentar, são aplicáveis os mesmos mecanismos de cobrança, incluindo a medida coercitiva de prisão civil, prevista no artigo 528 do CPC. A lógica do tribunal é que não seria coerente atribuir a mesma obrigação, mas com instrumentos de cobrança de eficácia distinta. Portanto, legalmente, não há dúvidas: avós devedores de alimentos podem, sim, ser presos.

Requisitos e Ponderações: Uma Medida Aplicada com Extrema Cautela

Apesar de a possibilidade legal ser clara, a sua aplicação na prática é cercada de cuidados e ponderações pelos juízes. Decretar a prisão de uma pessoa idosa é uma medida de enorme impacto e gravidade. Por isso, os magistrados tendem a ser muito mais cautelosos e criteriosos do que quando a ordem é contra um dos pais. O juiz certamente levará em consideração fatores como a idade avançada dos avós, suas condições de saúde (muitas vezes frágeis), e o fato de que sua fonte de renda, na maioria dos casos, é uma aposentadoria de valor limitado. É altamente provável que, antes de chegar ao ponto da prisão, o juiz tente esgotar todas as outras vias de cobrança, como a penhora de parte da aposentadoria (que também é permitida para dívida alimentar, respeitando os limites) ou a busca por outros bens penhoráveis.

Solidariedade Divisível: A Cobrança de Avós Paternos e Maternos

Outro ponto prático fundamental é que a obrigação alimentar dos avós, segundo o entendimento mais recente do STJ, é divisível e não solidária. Isso significa que a responsabilidade deve ser diluída entre os avós paternos e maternos, na proporção dos recursos de cada um. Não se pode cobrar 100% da dívida de apenas um dos avós se os outros também possuem condições de contribuir. Essa divisão também impacta a execução: a ordem de prisão só poderá ser decretada contra o avô ou avó que deixou de pagar a sua cota-parte específica da dívida, e não pela dívida inteira. O credor deve, idealmente, processar todos os avós para que o juiz fixe a responsabilidade de cada núcleo familiar.

A prisão civil de avós é, portanto, a última e mais dramática ferramenta do sistema judiciário para garantir que uma criança não fique desamparada. Sua possibilidade legal é um forte recado sobre a força do princípio da solidariedade familiar, que estende o dever de sustento para além da relação entre pais e filhos. Contudo, sua aplicação prática, rara e criteriosa, demonstra a sensibilidade da Justiça ao lidar com devedores que, em sua maioria, são pessoas idosas. É um lembrete de que a responsabilidade de cuidar das novas gerações é um dever que, em situações extremas, pode e irá alcançar toda a estrutura familiar.

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