Pensão Alimentícia Internacional: Como Cobrar Alimentos de um Pai/Mãe que Vive no Exterior?

A globalização e a facilidade de locomoção entre países trouxeram uma nova e complexa realidade para o Direito de Família: a cobrança de pensão alimentícia de um pai ou mãe que reside no exterior. Para o guardião que permanece no Brasil com a criança, a situação pode parecer uma causa perdida, um labirinto de burocracia internacional intransponível. No entanto, o Brasil é signatário de diversos tratados e convenções internacionais que criaram mecanismos de cooperação jurídica para tornar essa cobrança viável. Embora o processo seja mais demorado que uma cobrança nacional, é perfeitamente possível garantir que a responsabilidade parental ultrapasse fronteiras.
A Cooperação Jurídica Internacional: A Ponte Entre os Países
A cobrança internacional de alimentos só é possível porque existem acordos de cooperação jurídica internacional. O mais importante deles para o Brasil é a Convenção de Nova Iorque sobre Prestação de Alimentos no Estrangeiro (1956), promulgada aqui pelo Decreto nº 56.826/65. Além dela, existem outros acordos bilaterais e a Convenção da Haia sobre Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família (2007), que modernizou os procedimentos. Esses tratados criam uma ponte oficial de comunicação entre os sistemas judiciários dos países signatários.
Na prática, isso significa que uma decisão judicial brasileira que fixa a pensão pode ser reconhecida e executada em outro país, e vice-versa. Para que isso aconteça, cada país designa uma “Autoridade Central”, que é o órgão do governo responsável por intermediar toda a comunicação. No Brasil, a Autoridade Central é o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O Passo a Passo Simplificado da Cobrança Internacional
O processo, embora pareça complexo, segue uma lógica de cooperação. Os passos gerais são:
- Ter uma Decisão Judicial no Brasil: O primeiro passo indispensável é ter uma ação de alimentos julgada no Brasil, com uma sentença que fixe o valor da pensão. Não é possível iniciar a cobrança internacional sem uma decisão judicial brasileira.
- Reunir e Traduzir a Documentação: O guardião, com seu advogado, deve reunir todos os documentos necessários: cópia da sentença, certidão de nascimento da criança, documentos pessoais, e um formulário específico preenchido. A parte crucial é que todos esses documentos devem ser traduzidos para o idioma oficial do país onde o devedor reside, por um tradutor juramentado.
- Enviar o Pedido à Autoridade Central (DRCI): Todo o dossiê é enviado para a Autoridade Central brasileira (DRCI). Este órgão fará a análise formal dos documentos e, estando tudo correto, enviará o pedido oficialmente para a Autoridade Central do país estrangeiro.
- Execução no País Estrangeiro: A Autoridade Central estrangeira recebe o pedido e o encaminha para o órgão de justiça competente em seu território. A partir daí, a cobrança será processada de acordo com as leis locais do país onde o devedor se encontra. Isso pode incluir desconto em folha, bloqueio de contas ou outras medidas previstas na legislação daquele país.
Localizando o Devedor e a Importância da Informação
Um dos maiores desafios é a localização do devedor no exterior. Quanto mais informações o credor tiver sobre o devedor, mais rápido e eficaz será o processo. Endereço residencial, local de trabalho, número de telefone, dados de contas bancárias no exterior – tudo isso é ouro. Caso o endereço seja desconhecido, a cooperação jurídica internacional também pode ser usada para solicitar às autoridades estrangeiras que realizem buscas para localizar o devedor, embora isso torne o processo mais longo.
A Via Diplomática e a Complexidade do Processo
É preciso ter paciência. O trâmite envolve diferentes órgãos, traduções, e a burocracia de dois sistemas judiciários distintos. O processo pode levar de meses a anos para começar a surtir efeito. No entanto, é o único caminho formal e seguro. Tentar contratar um advogado diretamente no país estrangeiro costuma ser muito mais caro e complicado. A via da cooperação jurídica, através das Autoridades Centrais, é gratuita (embora os custos com tradução e cópias fiquem a cargo do interessado) e utiliza a estrutura oficial dos governos para fazer valer o direito da criança.
A distância geográfica não pode servir de escudo para a irresponsabilidade parental. Os mecanismos de cooperação internacional, embora complexos, são a prova de que o direito a alimentos é um valor universal, e a Justiça brasileira, em conjunto com seus parceiros internacionais, dispõe das ferramentas para garantir que esse direito fundamental seja respeitado, não importando onde o devedor escolha viver.