Partilha de Bens no Divórcio: Como Funciona em Cada Regime de Casamento?

A pergunta que ecoa em praticamente todo processo de divórcio é: “Com o que eu vou ficar?”. A ansiedade por trás dessa questão é compreensível, pois ela envolve o futuro financeiro, a moradia e a estabilidade de cada um. A resposta, no entanto, não depende de discussões acaloradas, do senso de “justiça” de cada um ou de quem contribuiu mais ou menos financeiramente. A resposta é técnica e está definida em um documento assinado anos antes, no momento do casamento: a certidão que estabelece o regime de bens. Este regime é a “constituição” da vida patrimonial do casal, ditando as regras do jogo do início ao fim. Compreender como funciona cada um deles é o passo fundamental para ter clareza sobre seus direitos e expectativas.

A Regra Padrão no Brasil: Comunhão Parcial de Bens. Este é o regime mais comum, pois é o regime legal automático para todos que se casam sem fazer um pacto antenupcial. Sua lógica é relativamente simples: o que era de cada um antes do casamento continua sendo (são os “bens particulares”). O que se divide é apenas o patrimônio construído durante a união. A regra de ouro é: todos os bens adquiridos onerosamente (comprados com fruto do trabalho) durante o casamento pertencem a ambos e serão divididos em 50% para cada um, não importando em nome de quem o bem está registrado ou quem efetivamente pagou por ele. Bens recebidos por um dos cônjuges através de herança ou doação, mesmo durante o casamento, não entram na partilha, pois não foram uma conquista do esforço comum do casal.

A “Mistura Total”: Comunhão Universal de Bens. Para optar por este regime, hoje menos comum, o casal precisa ter feito um pacto antenupcial antes do casamento. Como o nome sugere, a regra aqui é a da união máxima. Na comunhão universal, todos os bens, tanto os que cada um possuía antes de casar quanto os adquiridos durante a união, formam uma massa patrimonial única que será dividida meio a meio. Isso inclui, inclusive, bens recebidos por herança ou doação por qualquer um dos cônjuges. É a fusão completa dos patrimônios, onde o passado e o presente se tornam um só bolo a ser dividido. As exceções a essa regra são raríssimas, como bens gravados com cláusula de incomunicabilidade ou dívidas de atos ilícitos.

“O que é meu é meu, o que é seu é seu”: Separação Total de Bens. Também exigindo um pacto antenupcial, este regime é o oposto da comunhão universal. Na separação total (também chamada de convencional), não existe patrimônio comum do casal. Cada cônjuge é dono exclusivo de seus bens, sejam eles adquiridos antes ou durante o casamento, e não há nada a ser partilhado no divórcio. Cada um administra seu patrimônio de forma independente, podendo vendê-lo ou comprá-lo sem a necessidade de autorização do outro. É importante não confundir este regime com a “separação obrigatória de bens”, que é imposta por lei em algumas situações (como para maiores de 70 anos). Neste último caso, a Súmula 377 do STF estabelece que os bens adquiridos na constância do casamento por esforço comum devem ser partilhados, o que o aproxima da comunhão parcial.

O Modelo Híbrido: Participação Final nos Aquestos. Este é, de longe, o regime mais raro e complexo, funcionando como uma mistura dos regimes de separação e comunhão parcial. Durante o casamento, tudo funciona como em uma separação total: cada cônjuge tem seu próprio patrimônio e o administra livremente. A grande mudança ocorre no momento do divórcio. Neste ponto, faz-se um balanço: apura-se o patrimônio que cada um possuía ao casar e o patrimônio que possui no momento do divórcio. O que será dividido é apenas o acréscimo patrimonial oneroso de cada um, ou seja, o “lucro” obtido durante o casamento, que é chamado de “aquestos”. É um regime que exige uma contabilidade rigorosa da vida do casal e é pouquíssimo utilizado na prática. Entender o seu regime de bens é o ponto de partida para qualquer conversa sobre divórcio. Essa informação, que consta na certidão de casamento, definirá todo o seu futuro patrimonial.

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