Pais com Transtornos Psiquiátricos (Ex: Narcisismo, Bipolaridade) e a Disputa pela Guarda

As disputas de guarda já são, por natureza, emocionalmente complexas. Quando um dos genitores é diagnosticado ou apresenta traços severos de um transtorno psiquiátrico – como Transtorno de Personalidade Narcisista, Transtorno Afetivo Bipolar, Borderline, entre outros – a complexidade atinge um novo patamar. O comportamento imprevisível, a instabilidade emocional ou a manipulação associada a certas condições podem gerar um ambiente tóxico e prejudicial para o desenvolvimento de uma criança. No entanto, é crucial abordar este tema com cuidado e sem estigmas: ter um diagnóstico psiquiátrico não significa, automaticamente, a perda do direito à guarda. A análise judicial será focada em um único ponto: como e em que medida o transtorno, especialmente se não tratado, impacta a capacidade daquele indivíduo de exercer uma parentalidade segura, estável e saudável.

O cerne da questão judicial não é o rótulo diagnóstico, mas a funcionalidade parental. O juiz, com o auxílio de peritos, buscará responder a perguntas como:

  • O transtorno do genitor o impede de prover as necessidades básicas da criança de forma consistente?
  • A instabilidade de humor ou o comportamento impulsivo colocam a criança em situação de risco físico ou emocional?
  • O genitor tem consciência de sua condição (insight) e adere a um tratamento adequado (psicoterapia, medicação)?
  • O transtorno envolve traços manipulatórios ou uma visão distorcida da realidade que possa levar à alienação parental? (Como frequentemente ocorre em casos de narcisismo patológico).
  • A criança está sendo exposta a um ambiente caótico, negligente ou excessivamente instável por conta da condição do genitor?

A resposta a essas perguntas é que definirá o caminho da decisão judicial, e não a simples apresentação de um CID (Classificação Internacional de Doenças). Um genitor com transtorno bipolar que está em tratamento, medicado e com sua condição estabilizada pode ser um pai ou mãe perfeitamente capaz e amoroso. Por outro lado, um genitor com traços narcisistas severos, que se recusa a buscar tratamento e utiliza a criança como um peão em seu jogo de manipulação, representa um risco psicológico imenso, mesmo sem um diagnóstico formalizado em laudo.

Diante de uma alegação tão séria, a prova técnica torna-se a rainha do processo. Não basta que um cônjuge acuse o outro de ser “narcisista” ou “bipolar”. É preciso mais. As provas cruciais nestes casos são:

  • Laudos Médicos e Psicológicos: Laudos de psiquiatras e psicólogos que acompanham o genitor (ou que o avaliaram em perícia) são fundamentais. Eles descreverão o diagnóstico, o tratamento recomendado, a adesão do paciente e os impactos da condição em sua vida cotidiana.
  • Estudo Psicossocial: A avaliação da equipe técnica do fórum é indispensável. O psicólogo e o assistente social avaliarão a dinâmica familiar, o ambiente de cada lar e a interação dos pais com a criança, sendo capazes de identificar padrões de comportamento disfuncionais que podem ser invisíveis em documentos.
  • Provas do Comportamento: Mensagens de texto, áudios e vídeos que demonstrem o comportamento errático, manipulador ou negligente do genitor são provas factuais que materializam os efeitos do transtorno na prática.

A decisão final do juiz pode variar imensamente. Se for comprovado que o transtorno, pela falta de tratamento ou por sua gravidade, representa um risco real para a criança, o juiz certamente deferirá a guarda unilateral ao genitor que demonstra maior estabilidade. O regime de convivência do outro genitor poderá ser, inclusive, fixado na modalidade assistida, para garantir a segurança da criança durante os encontros. Por outro lado, se o genitor comprova que, apesar do diagnóstico, está em tratamento e plenamente funcional, a guarda compartilhada pode ser mantida, talvez com algumas salvaguardas adicionais no plano de parentalidade.

Lidar com um processo de guarda envolvendo transtornos psiquiátricos é delicado e exige uma assessoria jurídica e psicológica especializada. É uma batalha que deve ser travada não com o objetivo de estigmatizar, mas com o foco único e inabalável de proteger a criança de um ambiente que possa comprometer sua saúde mental e seu direito a um desenvolvimento pleno e seguro.

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