O Prazo para Entrar na Justiça: Até Quando Posso Reclamar a Indenização por um Atraso de Voo Ocorrido no Passado?

Muitas vezes, no calor do momento de um voo atrasado, o cansaço e a frustração são tão grandes que a última coisa em que pensamos é em iniciar um processo judicial. A vida continua, e aquele episódio de transtorno acaba sendo deixado de lado. Meses ou até anos depois, ao conversar com um amigo ou ler uma notícia, você se lembra do ocorrido e se pergunta: “Será que eu ainda posso buscar meus direitos?”. A resposta é sim, mas não para sempre. A lei estabelece um prazo para que você possa reclamar sua indenização, conhecido como prazo prescricional. Perder esse prazo significa perder o direito de ação.
O Que é Prescrição? A Perda do Direito Pelo Decurso do Tempo
A prescrição é um conceito jurídico que visa a trazer segurança e estabilidade às relações sociais. Ela estabelece que o titular de um direito tem um tempo limitado para exercê-lo na justiça. A ideia é que as situações não fiquem indefinidamente abertas a disputas. Se você não busca seu direito dentro do prazo que a lei estipula, presume-se que você renunciou a ele. No contexto dos direitos do consumidor, esse prazo é sua janela de oportunidade para transformar uma reclamação em uma ação judicial efetiva.
A Regra para Voos Domésticos: 5 Anos, Conforme o Código de Defesa do Consumidor
Para problemas ocorridos em voos dentro do território brasileiro (voos domésticos), a regra aplicável é a do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O artigo 27 do CDC é claro ao estabelecer que o prazo para o consumidor buscar a reparação pelos danos causados por uma falha na prestação de um serviço é de 5 (cinco) anos.
O marco inicial para a contagem desse prazo é a data do evento danoso, ou seja, o dia em que o voo atrasou ou foi cancelado. Portanto, se seu voo de São Paulo para Recife atrasou em 15 de julho de 2025, você terá até 14 de julho de 2030 para ingressar com a ação de indenização. Esse é um prazo consideravelmente longo, que permite ao consumidor se organizar e decidir com calma se vale a pena buscar a reparação.
A Polêmica dos Voos Internacionais: 2 ou 5 Anos?
Aqui a situação foi, por muito tempo, mais complexa. As Convenções de Montreal e Varsóvia, que regem o transporte aéreo internacional, preveem um prazo prescricional mais curto, de apenas 2 (dois) anos. Durante anos, as companhias aéreas defenderam a aplicação desse prazo para todos os pedidos de indenização em voos internacionais.
No entanto, uma decisão crucial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.842.889, veio para pacificar a questão, fazendo uma distinção importante. O STJ decidiu que:
- O prazo de 2 anos das convenções internacionais se aplica a pedidos de reparação por danos materiais (como extravio de bagagem).
- Para pedidos de indenização exclusivamente por danos morais decorrentes de atraso ou cancelamento de voo, o prazo a ser aplicado é o de 5 anos do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de uma relação de consumo.
Na prática, como a maioria das ações de passageiros envolve um pedido de dano moral (seja isolado ou junto com o dano material), o prazo de 5 anos acaba sendo a regra geral para a grande maioria dos casos, mesmo em voos internacionais. Essa interpretação é mais benéfica ao consumidor e tem sido amplamente adotada.
Não Deixe para a Última Hora: Por Que Agir Cedo é Melhor?
Ainda que o prazo de 5 anos pareça confortável, deixar para buscar seus direitos na última hora é uma péssima estratégia. Com o tempo, as provas se perdem. Você pode deletar o e-mail de confirmação da passagem, perder o cartão de embarque, esquecer detalhes importantes do ocorrido ou perder o contato de eventuais testemunhas. Quanto mais próximo do fato, mais frescas estarão as memórias e mais fácil será reunir a documentação necessária para construir um caso sólido. Além disso, o valor da indenização, quando finalmente pago, sofrerá os efeitos da inflação, e a sensação de justiça tardia pode não ser tão satisfatória.
O tempo é um fator crucial no direito. Conhecer o prazo prescricional lhe dá a segurança de saber qual é sua janela de oportunidade. Se você sofreu um transtorno aéreo, mesmo que há 2, 3 ou 4 anos, saiba que seu direito provavelmente ainda está vivo. Busque seus documentos, relembre os fatos e não deixe que a inércia faça você perder a chance de ser devidamente reparado.