O Nascimento de Outro Filho Justifica o Inadimplemento da Pensão? O Entendimento dos Tribunais

É um dos dilemas mais comuns na vida de pais separados: a chegada de um novo filho, fruto de um novo relacionamento, traz alegrias, mas também um aumento significativo nas despesas familiares. Diante desse novo cenário financeiro, muitos genitores questionam se essa nova responsabilidade não seria uma justificativa plausível para atrasar ou reduzir o pagamento da pensão do filho da união anterior. Acreditam que a Justiça será compreensiva com a necessidade de prover para a nova criança. No entanto, o entendimento dos tribunais sobre o tema é consolidado e pode surpreender quem usa esse argumento como escudo em um processo de execução.
O Princípio da Paternidade Responsável e a Vedação ao Prejuízo
O sistema jurídico brasileiro opera sob o princípio da paternidade (e maternidade) responsável. Isso significa que as decisões tomadas pelos pais em suas vidas pessoais não podem, em regra, prejudicar os direitos já garantidos aos seus filhos. Sob essa ótica, os tribunais entendem que a constituição de uma nova família e o nascimento de um novo filho são atos de livre e espontânea vontade do genitor, cujas consequências financeiras devem ser por ele planejadas e suportadas, sem que isso implique em um “rebaixamento” do direito ao sustento do filho preexistente. Em outras palavras, as necessidades do primeiro filho não diminuem com a chegada de um irmão, e a responsabilidade do pai para com ele permanece intacta.
Na Execução de Alimentos: Um Argumento Quase Sempre Rejeitado
Este é o ponto crucial que precisa ficar claro: no contexto de um processo de execução de alimentos, onde a ameaça de prisão já é real por dívidas passadas, o argumento do nascimento de um novo filho é quase sempre rejeitado. Lembre-se, para afastar a prisão, a justificativa deve ser de uma “impossibilidade absoluta, involuntária e imprevisível” de pagar. O nascimento de um filho, embora oneroso, é um evento previsível e planejado (na maioria dos casos), não se enquadrando no conceito de impossibilidade absoluta que a lei exige. O juiz da execução entenderá que o devedor deveria ter se organizado financeiramente para continuar a prover para ambos os filhos, e não simplesmente deixar de pagar a pensão do mais velho.
O Palco Correto para a Discussão: A Ação Revisional de Alimentos
Se o argumento é fraco na defesa da execução, ele é, por outro lado, extremamente relevante e válido em outro tipo de processo: a Ação Revisional de Alimentos. Este é o palco correto para essa discussão. Enquanto a execução cobra o passado, a revisional discute o futuro. O nascimento de um novo filho é, sim, um fato novo que altera a capacidade financeira do alimentante, sendo um dos principais motivos que autorizam o ajuizamento de uma ação para rever e, possivelmente, reduzir o valor da pensão para as parcelas futuras. É nesta ação, de caráter proativo, que o pai poderá demonstrar ao juiz sua nova realidade financeira e pedir um reequilíbrio de suas obrigações.
O Trinômio Necessidade-Possibilidade-Proporcionalidade em Ação
Na Ação Revisional, o juiz fará uma análise detalhada do famoso trinômio jurídico. Ele irá avaliar: a possibilidade do pai (sua renda total e suas despesas, incluindo as do novo filho); a necessidade do primeiro filho (seus gastos com escola, saúde, lazer, etc.); e a necessidade do novo filho. Com base nesses três pilares, o juiz buscará a proporcionalidade, fixando novos valores que, idealmente, não sobrecarreguem o pai a ponto de ele não conseguir pagar, mas que também não desamparem nenhum dos filhos. O objetivo é tratar a prole de forma isonômica, garantindo que a chegada do novo irmão não signifique o desamparo do mais velho. O resultado pode ser, de fato, a redução do valor da primeira pensão, mas isso só ocorrerá para o futuro, após a decisão judicial na ação revisional.
Em síntese, não use o nascimento de seu novo filho como desculpa para uma dívida que já existe. Essa estratégia certamente falhará no processo de execução e pode até ser vista como má-fé. Em vez disso, use esse fato novo e importante como o fundamento para uma Ação Revisional. A Justiça não pune quem decide aumentar a família, mas exige que isso seja feito com planejamento e responsabilidade, honrando todos os compromissos paternos. Aja de forma proativa para ajustar suas obrigações ao invés de reativamente se defender de uma prisão.