O Impacto da Guarda Compartilhada no Valor da Pensão Alimentícia: Mitos e Verdades
A guarda compartilhada, instituída por lei como o modelo preferencial no Brasil, veio para reforçar a ideia de que a responsabilidade pela criação dos filhos é de ambos os genitores, mesmo após o fim do relacionamento. Contudo, a popularização desse modelo trouxe consigo um dos maiores e mais persistentes mitos do Direito de Família: a crença de que na guarda compartilhada, não há obrigação de pagar pensão alimentícia. Muitos pais acreditam que, por dividirem as decisões e o tempo de convivência com o filho, a obrigação financeira se extingue automaticamente. Essa percepção é fundamentalmente equivocada e pode levar a graves conflitos e a processos de execução. Este artigo visa desvendar os mitos e esclarecer as verdades sobre a relação entre a guarda compartilhada e a pensão.
Mito 1: “Guarda Compartilhada é Guarda Alternada”
O primeiro erro é confundir os conceitos. Na guarda alternada (pouco aplicada no Brasil), o filho reside por períodos alternados e exclusivos com cada genitor (ex: uma semana com o pai, uma semana com a mãe), e durante esse período, o genitor da vez arca com todas as despesas. Já na guarda compartilhada, o que se compartilha é a responsabilidade e as decisões sobre a vida do filho (escolha da escola, do plano de saúde, etc.), mas a criança possui uma residência fixa principal, um lar de referência. O genitor que não mora com a criança exerce um direito de convivência ampliado, mas as despesas cotidianas continuam concentradas na casa de referência.
Verdade 1: A Pensão Existe para Equilibrar o Padrão de Vida
O fundamento da pensão alimentícia não é “pagar o outro genitor”, mas sim garantir que o filho mantenha um padrão de vida semelhante ao que tinha antes da separação, e que esse padrão seja custeado por ambos os pais, na proporção de suas capacidades financeiras. Mesmo na guarda compartilhada, um dos genitores (aquele que tem a maior renda) quase sempre terá uma capacidade financeira superior ao outro. A pensão alimentícia, nesse contexto, serve justamente para equilibrar essa balança, permitindo que o genitor que vive com a criança e arca com os custos fixos da moradia (aluguel, condomínio, luz, internet, supermercado) possa oferecer ao filho um padrão de vida que não seria possível apenas com sua própria renda.
Mito 2: “Se Dividimos o Tempo, Dividimos as Despesas e a Pensão Zera”
Outro mito comum é achar que, se o pai fica com o filho nos fins de semana e paga por seu lazer e alimentação durante esse período, ele estaria isento da pensão. Isso não é verdade. As despesas que o genitor não residente tem durante os dias de convivência são consideradas despesas extraordinárias ou de convívio, e não se confundem com a obrigação alimentar mensal e fixa. A pensão alimentícia se destina a cobrir os gastos fixos e essenciais da criança, que existem independentemente de com quem ela esteja no fim de semana, como mensalidade escolar, plano de saúde, custos da moradia, vestuário, etc.
Verdade 2: A Guarda Compartilhada PODE Influenciar no Valor da Pensão
Apesar de não extinguir a obrigação, o modelo de guarda compartilhada pode, sim, influenciar no cálculo do valor da pensão. Se o regime de convivência for bastante ampliado (por exemplo, o pai fica com o filho durante a semana também, leva e busca na escola, arca diretamente com o custo do uniforme e do material escolar), o juiz pode levar isso em conta. Se o genitor não residente comprovar que já arca diretamente com uma parte significativa das despesas ordinárias do filho, o valor da pensão a ser pago em dinheiro para o outro genitor pode ser reduzido, pois parte da obrigação já estaria sendo cumprida “in natura” (através do pagamento direto das despesas). A análise será sempre caso a caso.
A guarda compartilhada é um avanço que visa o melhor interesse da criança, promovendo a participação ativa e contínua de ambos os pais em sua vida. Confundi-la com uma isenção da responsabilidade financeira é um erro que prejudica diretamente o filho. A pensão alimentícia, nesse modelo, reafirma seu verdadeiro papel: não o de remunerar o guardião, mas o de ser um instrumento de equilíbrio e justiça, garantindo que a criança possa usufruir, em ambos os lares, de um padrão de vida condizente com as possibilidades de seus dois genitores. A responsabilidade é compartilhada, mas o dever de prover financeiramente, na proporção da capacidade de cada um, permanece intacto.