O Chamamento ao Processo dos Avós na Ação de Alimentos: Pode o Pai “Chamar” os Avós para Ajudar a Pagar a Pensão?

Imagine a seguinte situação: um pai é processado por seu filho para pagar pensão alimentícia. Ele reconhece o dever, mas alega em sua defesa que não possui condições de arcar com o valor total pedido pela mãe. Em um impulso lógico, ele pensa: “Se eu não posso pagar tudo, vou ‘chamar’ meus pais, os avós da criança, para que entrem no processo e me ajudem a completar o valor”. Essa manobra, conhecida no jargão jurídico como “chamamento ao processo”, parece uma solução razoável. No entanto, no campo específico e urgente da ação de alimentos, essa estratégia encontra uma barreira legal intransponível. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é firme em vedar essa possibilidade, protegendo a celeridade do processo e a responsabilidade primária dos pais.
O Que é o Instituto do “Chamamento ao Processo”?
Para entender a proibição, primeiro é preciso saber o que é o chamamento ao processo. Previsto no artigo 130 do Código de Processo Civil, este instituto é uma forma de intervenção de terceiros provocada pelo réu. Ele permite que o devedor original traga para o mesmo processo outros coobrigados ou devedores solidários pela mesma dívida. O objetivo é formar um título executivo judicial que já inclua todos os responsáveis, permitindo que o réu, caso pague a dívida integralmente, possa depois cobrar a cota-parte dos demais codevedores. É uma ferramenta de eficiência processual para dívidas com múltiplos devedores.
A Incompatibilidade com a Celeridade da Ação de Alimentos
O primeiro grande obstáculo à aplicação do chamamento ao processo é a própria natureza da ação de alimentos. Essas ações seguem um rito especial e prioritário (Lei nº 5.478/68), concebido para ser extremamente rápido, pois trata do sustento e da sobrevivência de uma pessoa. A introdução de novos réus no processo (os avós), com a necessidade de novas citações e novas defesas, inevitavelmente tornaria o andamento mais lento e complexo. Essa complexidade adicional é vista como incompatível com a urgência do crédito alimentar, e o direito da criança a uma solução rápida se sobrepõe ao interesse do pai em resolver sua relação com os avós no mesmo processo.
A Razão de Fundo: Obrigação Subsidiária Não Se Confunde com Solidária
O argumento jurídico central utilizado pelo STJ para vedar o chamamento ao processo é a natureza distinta das obrigações. O chamamento ao processo, em regra, aplica-se a devedores solidários, onde todos são responsáveis pela dívida inteira. No entanto, como vimos, a obrigação dos avós de pagar pensão não é solidária com a dos pais; ela é subsidiária. A jurisprudência pacífica do STJ estabelece que, por se tratar de uma obrigação subsidiária e complementar, e não solidária, não cabe o chamamento ao processo dos avós na ação de alimentos movida exclusivamente contra o genitor. São duas relações jurídicas diferentes: a do filho contra o pai (obrigação principal) e a do neto contra os avós (obrigação subsidiária).
O Caminho Correto para Cada um dos Envolvidos
Se o pai não pode “chamar” os avós, qual a solução? O caminho correto é distinto para cada parte. O pai, em sua defesa, deve se concentrar em provar exaustivamente a sua própria incapacidade de pagar o valor pedido, apresentando todas as provas de sua renda e despesas. Se, ao final do processo, o valor fixado ainda for insuficiente para as necessidades do filho, aí sim surge o caminho para os avós. O neto, representado por seu guardião, poderá, se quiser, ajuizar uma nova e separada ação de alimentos (complementares) contra os avós (todos eles, como vimos no artigo anterior), demonstrando que o valor pago pelo pai não é suficiente. O pai não pode usar o processo do filho para resolver uma questão que, em última análise, é de solidariedade entre ele e seus próprios pais.
Em suma, a tentativa de um pai de chamar os avós para o processo em que é réu é uma estratégia processual equivocada e que será barrada pelo Judiciário. A lei protege a relação direta e principal entre pais e filhos, garantindo que a discussão sobre a pensão seja focada e rápida. A responsabilidade dos avós, embora existente, pertence a um segundo momento e a um outro processo, respeitando a hierarquia e a natureza de cada obrigação familiar.