Guarda Unilateral: Quando a Exceção se Torna a Regra para Proteger a Criança?

Desde a promulgação da Lei nº 13.058/2014, a guarda compartilhada tornou-se a regra no sistema jurídico brasileiro, aplicada mesmo quando não há consenso entre os pais. Essa mudança reflete o entendimento de que a participação ativa e equilibrada de ambos os genitores é o que melhor atende aos interesses da criança. No entanto, o próprio texto da lei prevê suas exceções. A guarda unilateral, na qual um só dos genitores toma as decisões sobre a vida do filho, não foi extinta. Ela permanece como um instrumento jurídico crucial e necessário, uma medida de proteção que se impõe quando o compartilhamento da responsabilidade se torna inviável, perigoso ou simplesmente contrário ao bem-estar da criança.
A decisão pela guarda unilateral não é arbitrária nem se baseia na mera vontade de um dos pais. Ela exige uma fundamentação robusta, com provas concretas de que um dos genitores não possui condições de exercer o poder familiar de forma saudável e segura. A guarda unilateral é deferida quando o exercício da guarda compartilhada representa um risco para a integridade física, psicológica, moral ou emocional da criança. Não se trata de pequenas divergências sobre a educação ou de conflitos de rotina, mas de situações graves que quebram a premissa básica da cooperação e da parentalidade responsável.
Os motivos que levam um juiz a optar pela exceção da guarda unilateral são taxativos e precisam ser cabalmente demonstrados no processo. Entre os mais comuns, destacam-se:
- Violência Doméstica e Abuso: Se há histórico comprovado de violência física, psicológica ou sexual praticada por um genitor contra a criança ou contra o outro genitor na presença do filho, a guarda compartilhada é imediatamente descartada.
- Abandono Afetivo e Material: Aquele genitor que demonstra total desinteresse pela vida do filho, que não participa de sua rotina, não contribui para seu sustento e não mantém vínculos afetivos, pode perder o direito de compartilhar a guarda.
- Uso Abusivo de Álcool ou Drogas: A dependência química que compromete a capacidade do genitor de cuidar da criança, colocando-a em situação de risco ou negligência, é um forte motivo para a concessão da guarda unilateral ao outro.
- Alienação Parental Grave: Quando um dos genitores empreende uma campanha de desqualificação do outro a ponto de prejudicar o vínculo da criança com ele, o juiz pode, como medida punitiva e protetiva, inverter a guarda, concedendo a modalidade unilateral à vítima da alienação.
- Incapacidade Absoluta: Situações em que um dos genitores é acometido por uma doença psiquiátrica grave e incapacitante que o impede de tomar decisões coerentes e de prover um ambiente seguro.
É fundamental entender que a concessão da guarda unilateral a um genitor não elimina o direito de convivência (visitas) do outro, a menos que o contato represente um perigo iminente para a criança. Mesmo em casos de guarda unilateral, o genitor não guardião mantém o dever de supervisionar os interesses do filho e, claro, a obrigação de pagar a pensão alimentícia. O que ele perde é o poder de decisão sobre a vida da criança, que passa a ser centralizado no guardião. Em situações de risco extremo, a convivência pode ser determinada de forma assistida, ou seja, na presença de um terceiro ou em local determinado pelo juízo.
A busca pela guarda unilateral é um passo sério e que exige uma carga probatória muito elevada. Não basta alegar; é preciso provar por meio de documentos, laudos psicológicos, boletins de ocorrência, testemunhas e estudos psicossociais realizados pela equipe técnica do fórum. Ingressar com uma ação dessa natureza de forma leviana pode, inclusive, ser interpretado como litigância de má-fé. Portanto, a guarda unilateral não é uma arma para disputas conjugais, mas sim um escudo essencial para proteger a criança quando a regra da cooperação se mostra uma ameaça ao seu desenvolvimento seguro e feliz.