Guarda Compartilhada: Direitos e Deveres dos Pais na Prática

Poucos temas no Direito de Família são cercados por tantos mitos e incompreensões quanto a guarda compartilhada. A primeira imagem que vem à mente de muitos é a da “criança com uma malinha”, passando exatamente quinze dias na casa de cada genitor. É hora de desconstruir essa ideia de uma vez por todas. Guarda compartilhada, que desde a Lei nº 13.058/2014 é a regra no Brasil, não significa uma divisão matemática do tempo da criança, mas sim a divisão equilibrada das responsabilidades e das decisões mais importantes sobre a vida dela. É um modelo que coloca o foco no direito da criança de ter ambos os pais presentes e ativos em sua formação, mesmo que eles não vivam mais sob o mesmo teto.
O cerne da guarda compartilhada é a responsabilização conjunta e a tomada de decisões em comum. Na prática, isso significa que pai e mãe, juntos, têm a autoridade e o dever de deliberar sobre todas as questões fundamentais da vida do filho. Qual escola ele irá frequentar? Qual será o plano de saúde? Ele fará aulas de natação ou de judô? Receberá qual formação religiosa? Poderá fazer aquela viagem internacional com os avós? Nenhuma dessas decisões pode ser tomada de forma unilateral. Ambos os pais devem conversar, negociar e chegar a um consenso, sempre visando o melhor interesse da criança. O poder familiar, que antes ficava concentrado em quem detinha a guarda, agora é exercido de forma plena e igualitária por ambos.
Outro ponto que gera enorme confusão é a questão da moradia. A guarda ser compartilhada não implica, necessariamente, uma dupla residência ou a ausência de um lar fixo. Para garantir a estabilidade e a organização na rotina da criança, o juiz estabelecerá uma residência de referência ou um lar base, que será a casa de um dos genitores. Isso serve como referência para a escola, para o recebimento de correspondências e para a criação de um senso de pertencimento. O tempo de convivência com o outro genitor será definido de forma ampla e flexível, buscando sempre o equilíbrio. Pode ser em fins de semana alternados, com pernoites durante a semana, além da divisão de férias e feriados. O objetivo é garantir uma presença constante e significativa de ambos na vida cotidiana do filho.
Talvez o maior mito a ser combatido é a ideia de que a guarda compartilhada extingue a obrigação de pagar pensão alimentícia. Isso não é verdade. A fixação da guarda compartilhada não anula, em hipótese alguma, o dever de um dos pais de pagar pensão. A obrigação alimentar se baseia nas necessidades da criança e nas possibilidades financeiras de cada um dos pais. Normalmente, o genitor que possui maior capacidade financeira e não mora na residência de referência do filho pagará uma pensão ao outro. Esse valor serve para auxiliar no custeio das despesas diretas da criança (moradia, alimentação, luz, etc.) e para manter o padrão de vida que ela desfrutava antes da separação, garantindo o equilíbrio entre os dois lares.
Para que tudo isso funcione na prática e para minimizar os conflitos, a ferramenta mais poderosa à disposição dos pais é o Plano de Parentalidade. Trata-se de um acordo detalhado, que pode ser homologado pelo juiz, onde o casal estabelece o “manual de instruções” da sua nova dinâmica familiar. Nele, podem constar o cronograma de convivência, regras para a comunicação entre os pais, como as decisões sobre educação e saúde serão tomadas, diretrizes para viagens, entre muitos outros pontos. Elaborar um plano de parentalidade minucioso é a melhor forma de reduzir o desgaste, dar previsibilidade à criança e garantir que o foco permaneça sempre em seu bem-estar. A guarda compartilhada exige diálogo, maturidade e renúncia, pois o protagonismo não é mais do casal, e sim dos filhos.