Emendas Parlamentares e Nepotismo Cruzado: Como Identificar e Denunciar

Quando o poder vira moeda: os riscos ocultos no uso político das emendas e as brechas legais que ainda persistem

O nepotismo cruzado é uma prática política conhecida nos bastidores da administração pública, mas que, com o advento das emendas parlamentares impositivas e de relator (RP9), ganhou uma nova roupagem: a troca de favores entre políticos, utilizando o orçamento público para nomeações e repasses indiretos de recursos.

Neste artigo, você entenderá como essa prática tem se manifestado por meio da destinação de emendas, quais são os sinais de alerta, as formas de responsabilização e como denunciar casos suspeitos. Tudo com base na legislação brasileira e em precedentes recentes.


O que é nepotismo cruzado?

Nepotismo cruzado ocorre quando dois agentes públicos nomeiam parentes um do outro em cargos distintos, numa espécie de troca de favores para burlar a vedação legal ao nepotismo direto.

No contexto das emendas parlamentares, essa prática pode se materializar da seguinte forma:

  • Um deputado destina emenda para uma prefeitura;

  • O prefeito, como contrapartida informal, nomeia o cônjuge, filho ou parente do parlamentar para cargo comissionado no município;

  • Em troca, o parlamentar continua destinando recursos ou influencia novas liberações.

Essa conduta é vedada por princípios constitucionais e pode configurar ato de improbidade administrativa.


Fundamentos legais que proíbem a prática

A proibição do nepotismo (inclusive cruzado) tem base em diversos instrumentos jurídicos:

  • Súmula Vinculante nº 13 do STF: “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, para o exercício de cargo em comissão (…) viola a Constituição Federal.”

  • Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa): Enquadra como improbidade a nomeação ilegal visando benefício pessoal ou favorecimento indevido.

  • Art. 37, caput, da Constituição Federal: consagra os princípios da moralidade e impessoalidade na administração pública.

Ainda que o agente político alegue que o parente está qualificado, a motivação pessoal viola a ética pública e pode ser questionada judicialmente.


Como identificar o nepotismo cruzado ligado a emendas

É importante ficar atento a alguns indícios que podem revelar um esquema de favorecimento:

  • Nomeações recentes de familiares de parlamentares em municípios que receberam emendas volumosas;

  • Aumento repentino de verbas para municípios administrados por aliados políticos;

  • Nomeações cruzadas simultâneas entre diferentes entes da federação;

  • Repasses para entidades controladas por parentes ou empresas ligadas a servidores.

Essas informações podem ser cruzadas com dados públicos nos seguintes portais:

  • Portal da Transparência do Governo Federal (transferências voluntárias);

  • Siga Brasil (execução orçamentária por emenda);

  • TCEs e MP estaduais, que também fiscalizam prefeituras.

A tecnologia e os dados abertos são ferramentas valiosas para o cidadão identificar e combater irregularidades.


Exemplo prático: troca de cargos por emendas

Em 2023, o Ministério Público de um estado do Norte do país instaurou inquérito para apurar o repasse de R$ 4 milhões em emendas parlamentares a uma cidade pequena, cuja prefeita havia nomeado como secretário de obras o genro de um deputado federal da região. Os documentos mostraram que o secretário não tinha formação na área e sua nomeação ocorreu dias após a liberação da emenda.

O caso virou referência nacional e gerou recomendações do TCU para ampliar o controle sobre esse tipo de prática.


Como denunciar e responsabilizar os envolvidos

Cidadãos, servidores e entidades podem denunciar suspeitas de nepotismo cruzado nos seguintes canais:

  • Ouvidoria do Ministério Público Federal (MPF);

  • Tribunal de Contas da União (TCU);

  • Controladoria-Geral da União (CGU);

  • Comissões de Ética das Câmaras e Assembleias Legislativas.

A denúncia pode ser feita de forma anônima e online, devendo incluir o máximo de dados e indícios possíveis.

A responsabilização pode envolver suspensão dos direitos políticos, perda de cargo público, multa e até ação penal, se houver indícios de corrupção ou tráfico de influência.


Conclusão: ética e transparência como pilares da boa política

O uso de emendas parlamentares exige compromisso com o interesse público, e não com favores pessoais ou familiares. O nepotismo cruzado é uma forma sorrateira de desvirtuar a política pública e prejudicar a credibilidade da classe política.

Combater essa prática exige vigilância social, acesso à informação e atuação firme dos órgãos de controle. O cidadão informado é o maior aliado da ética pública.

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