
O que mudou na Constituição e por que isso transformou o orçamento público no Brasil
A expressão “emenda parlamentar impositiva” tem ganhado cada vez mais espaço nos debates jurídicos e políticos. Isso porque, ao contrário do modelo tradicional em que as emendas eram facultativas, o novo regime introduzido pela Emenda Constitucional nº 86/2015 alterou de forma significativa a dinâmica entre o Legislativo e o Executivo no que se refere à alocação de recursos públicos.
Mas o que exatamente são essas emendas impositivas? Quais os efeitos práticos e jurídicos desse modelo? E quais os limites legais para sua aplicação? Neste artigo, você entenderá como a Constituição garantiu o direito dos parlamentares de interferir diretamente no orçamento da União, com base em parâmetros legais e decisões dos tribunais.
O que diz a Constituição sobre as emendas impositivas?
A Emenda Constitucional nº 86/2015 modificou o artigo 166 da Constituição Federal, estabelecendo que as emendas individuais dos parlamentares ao Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) devem ser obrigatoriamente executadas até o limite de 1,2% da Receita Corrente Líquida (RCL) realizada no exercício anterior, sendo que metade desse valor deve obrigatoriamente ser destinado à saúde pública.
Isso significa que o governo federal tem o dever constitucional de liberar os recursos indicados nas emendas individuais, desde que observados os critérios técnicos e legais.
Essa inovação fortaleceu a atuação parlamentar, permitindo que deputados e senadores atuem mais diretamente nas políticas públicas e nos investimentos em seus redutos eleitorais — o que, em tese, fortalece a democracia representativa.
Como funciona a execução obrigatória?
Ao contrário do que muitos pensam, a execução obrigatória não é absoluta. A própria EC 86/2015 prevê exceções à obrigatoriedade, como a ocorrência de impedimentos de ordem técnica. Nesses casos, o Executivo deve justificar formalmente a não execução e permitir que o parlamentar reindique os recursos para outro fim compatível.
O STF, em julgamento recente (ADPF 1183/DF), reforçou que a execução das emendas impositivas deve respeitar os princípios da legalidade, impessoalidade e eficiência, e que a execução orçamentária não pode ser transformada em mecanismo de favorecimento político ou pessoal.
Portanto, embora sejam obrigatórias, as emendas impositivas estão condicionadas ao cumprimento de critérios legais e à transparência.
Quais são os impactos para a gestão pública?
A introdução da obrigatoriedade gerou debates entre juristas e especialistas em finanças públicas. Para alguns, a medida fortalece a atuação do Legislativo e descentraliza o poder orçamentário do Executivo. Para outros, pode comprometer a eficiência da gestão pública, ao engessar parte do orçamento e limitar a alocação técnica dos recursos.
Além disso, há o risco de uso político das emendas, especialmente em períodos eleitorais, o que pode comprometer a isonomia entre os municípios e dar margem a práticas clientelistas.
O desafio atual é equilibrar o direito legítimo dos parlamentares com os princípios de planejamento, transparência e eficiência na gestão orçamentária.
Exemplo prático: emendas na área da saúde
Um exemplo que evidencia a relevância das emendas impositivas está na área da saúde. Municípios que enfrentam dificuldades orçamentárias dependem, muitas vezes, desses recursos para a manutenção de hospitais, compra de medicamentos e custeio da atenção básica.
No entanto, a judicialização da execução de emendas na saúde tem crescido, principalmente quando há atrasos ou negativa de repasse. Isso exige que o operador do Direito conheça a legislação orçamentária, os procedimentos técnicos e a jurisprudência aplicável para atuar de forma eficaz.
Considerações finais
A emenda parlamentar impositiva representa um avanço na democratização do orçamento público, conferindo maior poder aos representantes eleitos para atender demandas locais. Contudo, sua execução deve respeitar os limites legais, os princípios constitucionais e os critérios técnicos definidos na legislação orçamentária.
Conhecer esse mecanismo é essencial para quem atua na gestão pública, no controle externo ou no Direito Administrativo. Afinal, o poder de decidir onde o dinheiro público será aplicado agora não é mais exclusivo do Executivo — é também um dever constitucional do Legislativo.