Divórcio Humanizado: É Possível Manter uma Relação de Respeito e Amizade com o Ex-Cônjuge?

A palavra “divórcio” carrega, em nosso imaginário, um peso de conflito, de guerra judicial, de adversários em um ringue. Contudo, uma nova mentalidade tem ganhado força nos corredores dos tribunais e, principalmente, nos corações das famílias: a de que o fim de um casamento não precisa ser o fim do respeito. É possível reestruturar uma família de forma digna, pacífica e colaborativa. Esse novo paradigma tem nome: Divórcio Humanizado. Longe de ser uma utopia, é uma abordagem prática e multidisciplinar que coloca as pessoas e suas emoções no centro do processo, buscando não apenas a dissolução legal do matrimônio, mas a preservação da saúde mental de todos os envolvidos e, acima de tudo, a continuidade de uma parceria parental saudável.
O que, de fato, define um divórcio como “humanizado”? Não se trata apenas de um processo consensual, embora o consenso seja sua consequência natural. É uma filosofia de trabalho que se apoia em alguns pilares fundamentais. O primeiro é o protagonismo das partes: as decisões mais importantes sobre o futuro da família são construídas pelo próprio casal, e não impostas por um juiz. O segundo é a comunicação não-violenta, que ensina a expressar necessidades e sentimentos sem o uso de acusações ou agressividade. O terceiro é o foco no futuro: em vez de gastar energia remoendo as culpas e os erros do passado, o casal é incentivado a direcionar seus esforços para a construção de um arranjo funcional e pacífico para o futuro, um futuro em que, apesar de não serem mais um casal, continuarão a interagir, especialmente se tiverem filhos.
Para colocar essa filosofia em prática, o Direito de Família moderno se vale de duas ferramentas poderosas: a Mediação e as Práticas Colaborativas. A Mediação Familiar, como já exploramos, é um procedimento em que um terceiro neutro e capacitado, o mediador, facilita o diálogo entre o casal, ajudando-os a superar impasses e a construir, eles mesmos, os termos de seu acordo. Já as Práticas Colaborativas são um modelo ainda mais sofisticado. Neste método, o casal e seus respectivos advogados assinam um contrato formal se comprometendo a não levar a questão ao litígio judicial. Todas as negociações ocorrem em reuniões conjuntas, que podem contar com a participação de outros profissionais, como psicólogos e planejadores financeiros, para auxiliar nas questões emocionais e técnicas. O incentivo ao acordo é enorme, pois se as negociações falharem, os advogados colaborativos são obrigados por contrato a se retirarem do caso, e o casal terá que contratar novos advogados para iniciar uma batalha judicial do zero.
O maior e mais duradouro benefício de uma abordagem humanizada é a preservação da parceria parental. Quando um divórcio é marcado por batalhas judiciais, a relação entre os pais é permanentemente envenenada, tornando a comunicação e a tomada de decisões conjuntas sobre os filhos uma fonte de estresse contínuo. Em contrapartida, quando os pais conseguem encerrar seu vínculo conjugal com respeito e colaboração, eles estabelecem uma base sólida para uma co-parentalidade saudável. Isso protege os filhos do estresse tóxico do conflito e do doloroso sentimento de lealdade dividida, sendo, talvez, o maior presente que pais que se separam podem oferecer a eles.
Resta a pergunta: é possível manter uma amizade? A resposta exige um ajuste de expectativas. O objetivo primordial do divórcio humanizado não é, necessariamente, a amizade, mas sim o respeito incondicional e a cooperação funcional. A amizade pode, sim, florescer com o tempo, como um bônus para aqueles que conseguiram processar bem o luto e ressignificar a relação. Contudo, forçar uma amizade pode ser artificial e até prejudicial. O verdadeiro sucesso de um divórcio humanizado se mede pela capacidade do ex-casal de sentar-se lado a lado em uma formatura ou festa de aniversário do filho, compartilhando daquele momento com genuína tranquilidade e alegria pela felicidade da criança. Isso, por si só, já é uma vitória imensa.