Dívidas no Casamento: Quem Paga o Quê Após o Divórcio?

Quando se fala em divórcio, a imagem que vem à mente é a da divisão de bens: a casa de praia, o apartamento na cidade, carros, investimentos. Poucos se lembram, no entanto, que o patrimônio de um casal não é feito apenas de ativos, mas também de passivos. As dívidas, aquele lado menos glamoroso e frequentemente negligenciado da vida a dois, também entram na partilha. Compreender quem é responsável por cada conta após a separação é fundamental para evitar surpresas desagradáveis, cobranças indevidas e um novo ciclo de conflitos judiciais. A lógica não é complexa, mas exige transparência e um olhar atento aos detalhes.
A regra de ouro que norteia a divisão de dívidas nos regimes de comunhão (como a comunhão parcial, que é a regra geral no Brasil) é simples: as dívidas contraídas por qualquer um dos cônjuges durante o casamento, visando atender aos encargos e necessidades da família, são de responsabilidade de ambos. O que importa não é em qual CPF a dívida foi registrada, mas sim se o valor obtido foi revertido em benefício da entidade familiar. Se a resposta for sim, a dívida é do casal e deve ser considerada na partilha, seja sendo paga com os bens comuns antes da divisão, seja sendo assumida por um dos dois com a devida compensação.
Para tornar o conceito mais claro, vejamos exemplos práticos de dívidas que, tipicamente, se comunicam. O financiamento do imóvel onde a família morava, as parcelas do carro usado por todos, a fatura do cartão de crédito usada para pagar supermercado, farmácia, escola dos filhos ou aquela viagem de férias. Até mesmo um empréstimo pessoal feito no nome de apenas um dos cônjuges, mas cujo dinheiro foi usado para reformar a casa ou pagar uma despesa médica familiar, será considerado uma dívida comum. Mesmo que o contrato esteja assinado por apenas uma pessoa, se a dívida foi contraída na constância do casamento e em prol da família, o outro cônjuge responde por ela com sua meação (sua metade nos bens do casal).
Por outro lado, existem as dívidas “particulares”, que são de responsabilidade exclusiva de quem as contraiu. A principal categoria são as dívidas anteriores ao casamento (exceto no regime de comunhão universal). Além delas, não se comunicam as dívidas que não trouxeram qualquer benefício à família, como aquelas originadas de atos ilícitos (uma indenização por acidente de trânsito causado por embriaguez, por exemplo), dívidas de jogo, ou gastos para benefício exclusivo e pessoal, como o financiamento de um hobby de luxo que não era compartilhado pelo casal. O grande desafio processual, nesses casos, recai sobre quem alega: é preciso provar que aquela dívida específica não reverteu, de forma alguma, em proveito da unidade familiar.
É crucial entender uma distinção final: o acordo de divórcio define a responsabilidade entre o casal, mas ele não altera o contrato original com o credor (banco, financeira). Por exemplo, o casal acorda que o ex-marido assumirá as parcelas restantes do financiamento do carro. Se ele deixar de pagar, o banco poderá cobrar judicialmente a ex-esposa, caso o nome dela também conste no contrato. O que ela poderá fazer é, após pagar a dívida, entrar com uma ação de regresso contra o ex-marido para ser reembolsada. Por isso, um bom acordo de divórcio deve ser extremamente detalhado, listando todos os passivos e estabelecendo claramente quem é o responsável por cada um, protegendo ambas as partes de futuras dores de cabeça financeiras.