Como a sociedade pode fiscalizar a aplicação de bilhões de reais em emendas parlamentares?
As emendas parlamentares movimentam cifras bilionárias todos os anos no orçamento público brasileiro, impactando diretamente áreas sensíveis como saúde, educação, infraestrutura e assistência social. No entanto, apesar do volume de recursos, o controle social ainda é uma das ferramentas menos utilizadas — e mais poderosas — para evitar abusos, desvios e ineficiência na aplicação desses recursos.
Neste artigo, você entenderá como os cidadãos e os conselhos de políticas públicas podem e devem acompanhar o uso das emendas parlamentares, quais instrumentos legais asseguram esse direito e por que a participação ativa da sociedade é um antídoto contra o mau uso do dinheiro público.
O que é controle social e por que ele é essencial?
O controle social é o direito e o dever da sociedade de participar, fiscalizar, monitorar e avaliar a atuação dos gestores públicos. Trata-se de uma extensão do princípio republicano, fundado na transparência, accountability e participação democrática, como previsto nos arts. 1º, parágrafo único, e 37 da Constituição Federal.
No contexto das emendas parlamentares, o controle social permite que a população:
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Acompanhe a indicação, liberação e execução dos recursos;
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Verifique se os projetos atendem às reais necessidades da comunidade;
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Denuncie desvios, irregularidades ou falta de transparência na aplicação das verbas.
Controle social é cidadania ativa. Onde ele funciona, há menos corrupção e mais justiça social.
Instrumentos jurídicos que asseguram o controle social
A participação da sociedade na fiscalização das emendas parlamentares está amparada por diversos instrumentos legais:
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Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) – garante o direito a qualquer cidadão de obter dados sobre transferências, convênios e execução de emendas;
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Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) – determina que o gestor deve prestar contas com transparência;
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Decreto nº 10.426/2020 – regulamenta a execução obrigatória das emendas de relator (RP9), prevendo mecanismos de rastreamento;
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Portais de Transparência da União, estados e municípios, bem como sistemas como o Siconv/Plataforma +Brasil, que exibem dados sobre cada transferência.
Não basta o direito estar na lei — é preciso que o cidadão exerça esse direito todos os dias.
Conselhos de políticas públicas: protagonismo necessário
Os conselhos de políticas públicas, como os Conselhos Municipais de Saúde, de Educação e de Assistência Social, têm função estratégica no controle da aplicação das emendas parlamentares.
Atribuições dos conselhos:
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Avaliar a pertinência das propostas de aplicação dos recursos;
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Participar da elaboração dos planos plurianuais e das leis orçamentárias;
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Acompanhar a execução física e financeira das ações financiadas com emendas;
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Emitir pareceres e relatórios que podem fundamentar ações do Ministério Público e Tribunais de Contas.
Exemplo prático: um Conselho Municipal de Saúde identificou que uma emenda parlamentar havia sido usada para a compra de equipamentos incompatíveis com o plano de atendimento local. Após denúncia ao MP, os recursos foram bloqueados e redirecionados corretamente.
Onde os conselhos são fortes, há menos desvio, menos desperdício e mais eficiência.
Obstáculos ao controle social efetivo
Apesar das garantias legais, o controle social enfrenta obstáculos como:
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Baixo acesso à informação ou linguagem técnica nos portais;
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Falta de capacitação dos conselheiros municipais;
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Pressões políticas sobre conselhos que deveriam ser autônomos;
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Pouca cultura de participação ativa entre os cidadãos.
Por isso, fortalecer o controle social exige educação cívica, acessibilidade às informações públicas e apoio técnico aos conselhos.
Como o cidadão pode começar a fiscalizar as emendas?
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Acesse o site da Câmara dos Deputados ou do Senado e consulte as emendas apresentadas por seu representante;
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Utilize a Plataforma +Brasil para verificar o andamento da execução das emendas;
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Participe das reuniões dos conselhos municipais ou se inscreva como conselheiro;
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Solicite informações via Lei de Acesso à Informação;
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Denuncie irregularidades ao Ministério Público, TCU ou à ouvidoria local.
Você não precisa ser técnico para fiscalizar. Precisa ser cidadão. E isso você já é.
Conclusão: sem controle social, a emenda vira moeda política
O controle social é a única ferramenta capaz de equilibrar o poder dos parlamentares com os direitos do povo. Quando há participação ativa da população, as emendas deixam de ser moeda de troca e passam a ser instrumento legítimo de justiça social.
O dinheiro é público. O mandato é temporário. Mas a cidadania é permanente. Exerça-a.