A Guarda de Filhos em Uniões Homoafetivas: Direitos e Deveres

Após a histórica decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011, que equiparou as uniões homoafetivas às uniões estáveis, e a Resolução nº 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2013, que obrigou os cartórios a realizarem casamentos entre pessoas do mesmo sexo, uma mensagem ficou clara: para o Estado brasileiro, família é família, independentemente do gênero das pessoas que a compõem. Essa isonomia de tratamento se reflete de forma plena no Direito de Família, especialmente na questão da guarda dos filhos. É crucial afirmar, de forma inequívoca: não existe absolutamente nenhuma diferença legal no tratamento da guarda de filhos de casais homoafetivos em comparação com casais heteroafetivos. Os direitos, deveres e procedimentos são exatamente os mesmos.
O ponto de partida para a discussão da guarda é o estabelecimento da filiação. Em casais homoafetivos, a filiação pode ocorrer por diferentes vias, como a adoção conjunta ou o uso de técnicas de reprodução assistida. No caso de duas mães, por exemplo, onde uma gesta o óvulo da outra ou de uma doadora, o registro de nascimento já pode ser feito em nome de ambas (dupla maternidade). O mesmo se aplica à dupla paternidade em casos de gestação por substituição (“barriga de aluguel”). Uma vez que a criança está registrada em nome de ambas as mães ou de ambos os pais, o vínculo de filiação está legalmente estabelecido, e com ele, nasce o poder familiar compartilhado, que é a base para todos os direitos e deveres parentais.
Quando um casal homoafetivo se separa, as regras para a definição da guarda são aplicadas sem qualquer tipo de distinção. A guarda compartilhada continua sendo a regra geral, conforme estabelece o Código Civil. Isso significa que ambos os pais ou ambas as mães continuarão a tomar as decisões sobre a vida do filho em conjunto e a dividir o tempo de convivência de forma equilibrada. A definição de um lar de referência, a divisão de tarefas cotidianas e o planejamento da rotina seguirão os mesmos critérios aplicados a qualquer outra família.
Da mesma forma, a guarda unilateral será a exceção, aplicada somente nos casos em que um dos genitores não tiver condições de exercer o poder familiar ou quando a guarda compartilhada representar um risco para a criança. A orientação sexual de um genitor ou de seu novo parceiro jamais poderá ser usada como argumento para pleitear a guarda unilateral ou para restringir a convivência. Qualquer decisão judicial que utilize a orientação sexual como critério para definir a guarda é considerada discriminatória, ilegal e passível de recurso, pois viola o princípio da igualdade e o melhor interesse da criança, que tem o direito de conviver com seus pais como eles são.
As questões financeiras, como a pensão alimentícia, também seguem a mesma lógica. Em caso de separação, o genitor que não detiver a residência principal ou que tiver uma condição financeira significativamente superior à do outro deverá pagar pensão para auxiliar no sustento do filho, garantindo a manutenção do padrão de vida da criança em ambos os lares. A partilha de bens, os direitos sucessórios e todas as outras consequências do fim da união são idênticas. A mensagem do sistema jurídico é de uma normalidade absoluta. O que importa para a definição da guarda não é o gênero dos pais, mas sim sua capacidade de amar, cuidar, proteger e prover as condições necessárias para o pleno e feliz desenvolvimento de seus filhos.